Cadeira | Cadeira Patronos | Acadêmicos Titulares –Ocupante 1 | Acadêmicos Titulares – Ocupante 2 | Acadêmicos Titulares – Ocupante 3 |
Nº 01 | Francisco Melo Franco | Sérgio Danilo Junho Pena | ||
Nº 02 | Fernando Magalhães Gomes | Roberto Assis Ferreira | ||
Nº 03 | Paulo Roxo da Motta | Cícero Plínio Bittencourt | Joel Alves Lamounier | |
Nº 04 | Berardo Nunan | Antônio José das Chagas | Virgínia Resende Silva Weffort | |
Nº 05 | Navantino Alves | Clarindo Elesbão de Siqueira | ||
Nº 06 | João da Costa Chiabi | Fábio Magalhães | ||
Nº 07 | Hugo Marques Gontijo | Fausto Pacheco | ||
Nº 08 | Celso Lobo de Resende | Francisco José Caldeira Reis | ||
Nº 09 | Elmo Perez dos Santos | Archimedes Theodoro | Eduardo Carlos Tavares | |
Nº 10 | Clóvis Boechat de Menezes | José Américo de Campos | Marcos de Carvalho Vasconcellos | |
Nº 11 | João Mello Teixeira | José Silvério Santos Diniz | José Maria Penido Silva | |
Nº 12 | João Afonso Moreira | Marcos Borato Viana | ||
Nº 13 | Delorme Neves de Carvalho | Waldemar Henrique Fernal | ||
Nº 14 | Maria Eulália Ramos | Cláudia Lúcia Carneiro Matos | ||
Nº 15 | Olavo de Freitas Lustosa | Francisco José Penna | ||
Nº 16 | Olavo de Resende Barros | José Sabino de Oliveira | ||
Nº 17 | Renato de Carvalho Loures | Adauto Barros Amin | ||
Nº 18 | Olavo Gabriel Diniz | José Bueno Villela | Fausto Gomes Baptista | Marco Antônio Chaves Gama |
Nº 19 | Maria Helena Moraes Jardim | Diomar Tartaglia | Luiz Megale | |
Nº 20 | Humberto de Oliveira Ferreira | Lincoln Marcelo Silveira Freire | Vera Lúcia Venâncio Gaspar | |
Nº 21 | Wilson Rocha | Paulo César Pinho Ribeiro | ||
Nº 22 | Waldir de Almeida Ribas | Ivani Novato Silva | ||
Nº 23 | Nivio Braz de Lima | Guy Freire Jannotti | ||
Nº 24 | Helvécio Henrique Ferreira Borges | Maria do Carmo Barros de Melo | ||
Nº 25 | Mário Afonso Moreira | Paulo Tadeu de Matos Pereira Poggiali |
PROFESSOR NAVANTINO ALVES *
– o decano dos pediatras mineiros –
autor: Clarindo Elesbão de Siqueira
A primeira vez que ouvi sobre Navantino Alves foi de minha mãe quando relatava: mesmo mocinha eu era muito requisitada para dançar em folguedos de nossa família e um dos moços que sempre me convidava era o doutor Navantino; como meu cabelo era muito anelado, invariavelmente se embaraçava na fina abotoadura do médico – o que era motivo do riso divertido de todos.(1)
Certamente numa dessas festas familiares surgiu o namoro e depois o casamento do andrelandense Navantino Alves com uma bela nepomucenense, prendada, inteligente, formada pelo Instituto Gammon de Lavras, sua eterna companheira, Elvira Veiga Sales, a Elvirinha. Tratava-se de feliz encontro entre duas vertentes da aristocracia sul-mineira. O andrelandense Navantino Alves, nascido em 1899, filho do rábula altruísta e jornalista de idéias progressistas José Bernardino Alves e da musicista Marianna Ilidia Alves – daí derivando laços de parentesco com gente ilustre do antigo Turvo, como os Silveira, Ribeiro Salgado, Ribeiro do Vale e Arantes, linhagem que, segundo o historiador Laerte Magno Ribeiro, integra 20 gerações de João Ramalho e Bartira. Aí se incluem nomes notáveis da medicina mineira e brasileira: entre outros, José Ribeiro do Vale, José Silva de Assis, Aparício Silva de Assis, Nassim Calixto da Silveira, José Gustavo Alves e Herculano Salazar.
Já Elvira Veiga Sales Alves, é consangüínea dos Veiga, Sales, Botelho, Ribeiro de Oliveira, Vilela e Garcia-Frade, que incluem figuras como, entre outras, os governadores Francisco Sales, Francisco Negrão de Lima e Hélio Garcia, os juristas João Pimenta da Veiga e João Batista Vilela, a deputada Maria Elvira Sales Ferreira , os educadores da clã Newton Paiva, e o ficcionista Luís Vilela. Na medicina, o cientista João Batista Veiga Sales, irmão de Elvira Sales Alves, merece citação especial, como discípulo dileto de Baeta Viana. Foi primeiro aluno de uma turma, a de 1937 de médicos da atual Universidade Federal de Minas Gerais, integrada por não menos que Romeu Cançado, J. B. Greco, Geraldo Queiroga e Olavo Gabriel Diniz. No Brasil, chegou a catedrático de bioquímica da Universidade de São Paulo e, nos EUA, foi auxiliar direto de Severo Ochoa no Instituto de Genética Molecular da Universidade da Florida, este estudioso de detalhes da síntese do DNA, que resultaram no Prêmio Nobel de Medicina de 1959.
A passagem de meu patrono Navantino Alves por Nepomuceno – após formar-se no Rio em 1924, pela Faculdade Nacional de Medicina – não apenas o fez nepomucenense adotivo, graças ao matrimônio feliz, mas propiciou-lhe uma espécie de pós-graduação rural assinalada na biografia de grandes médicos do mundo inteiro, como Eduardo Jenner, Roberto Koch, Vital Brasil, Guimarães Rosa e René Favaloro. E esse estágio foi-lhe tão marcante que o registrou no seu livro Páginas de recordações de um médico. Nele o autor fez observações, hoje de precioso significado, que só mesmo a condição de excelente clínico que era poderia facultar-lhe. Em sua infância assinalou a profusão de andorinhas em Andrelândia, escasseadas com o passar do tempo. Registrou o protesto do velho Preto Mina, inconformado com a procissão de São Benedito, que levava a imagem do santo etíope da igreja dos escravos à matriz dos brancos. Apoiado em rude bengala, lá ia ele a murmurar doce repreensão: num tem vergõia San Binidito, de i ôtra veis prá igreja dos branco?
Para mim, contudo, de particular interesse histórico, foi quando, montado em sua besta Baia, chegou a uma fazenda bem distante e ali percebeu toda a família do fazendeiro vítima de hanseníase. Em recente estudo que fiz sobre a epidemia desta doença, ora ainda em curso e que teve o epicentro em Poços de Caldas, na segunda metade do século 19, citei a descrição de Alves como eloqüente testemunho. Outro seu relato documental, muito expressivo, se refere à malária endêmica na bacia do Rio Grande, depois brilhantemente debelada, a partir do governo Milton Campos.
Após sua curta clínica rural em Nepomuceno, Navantino Alves foi para Juiz de Fora. As ligações entre essas duas cidades, na década de 20 do século 20, eram estreitas, seja pela nova comunicação ferroviária, seja decorrente da segurança proporcionada à elite nepomucenense pelo cirurgião Hermenegildo Vilaça. Sua esposa, Olívia Ribeiro de Oliveira, era parente dos Ribeiro de Oliveira de Nepomuceno, inclusive de Elvira Veiga Sales. Vilaça hoje é considerado o primeiro cirurgião moderno nativo de Minas, ao lado de dois mineiros adotivos: Borges da Costa e Afonso Pavie. As cirurgias nesta época implicavam os riscos do clorofórmio e da imperícia operatória. Daí que, diante de toda intervenção que exigisse anestesia geral, os parentes preferiam garantir-se com o consagrado pioneiro.
Por tais laços, Navantino Alves teve a oportunidade de clinicar sob o avançado ambiente da medicina juizdeforana, moldada, na própria cidade ou desde o Rio, por notáveis como João Penido, Eduardo de Menezes, José Nava (pai de Pedro Nava), Martinho da Rocha e Antônio da Silva Melo. Martinho da Rocha, com quem também trabalhou o meu patrono, fez importante ligação entre a pediatria brasileira e a alemã, e sabe-se que ambos faziam serões de leitura da pediatria em livros franceses e alemães, discutindo e digerindo os ensinamentos de Heinrich Finkelstein, Adalbert Czerny, Antonin Bernard Marfan, F. Nassau entre outros. O papel de Martinho da Rocha no Brasil foi análogo ao exercido nos EUA pelo grande pediatra alemão Abraão Jacobi. A pediatria brasileira já era ilustre graças a Francisco de Melo Franco e aos Moncorvo, pai e filho. Mas foram os mineiros Martinho da Rocha e Silva Melo que fizeram o nexo imediato entre a Universidade de Berlim, em seu esplendor científico, e a medicina brasileira (Martinho na pediatria e Melo na clínica médica e na gastroenterologia). Em Belo Horizonte, havia poucos seguidores da medicina germânica, principalmente na Faculdade de Medicina, com Melo Teixeira (depois acolitado por João da Costa Chiabi) e Navantino Alves chegou para reforçar esta linha. Observe-se que Teixeira foi paraninfo de Kubitschek, Pedro Sales e Pedro Nava, em 1927. Na verdade, Navantino Alves, que se dedicou à pediatria exclusiva desde sua graduação, trabalhando ainda como estudante com o famoso pediatra Calazans Luz nos ambulatórios e enfermarias de crianças do Hospital São Zacharias da Santa Casa do Rio de Janeiro, onde também criou e manteve por alguns anos a revista Escola Médica, se entusiasmou com essa modernidade pediátrica ao viver Juiz de Fora, e aí fundou com o obstetra Dirceu Andrade a Maternidade Terezinha de Jesus , anexa à Santa Casa de Juiz de Fora. Anos depois trouxe essa capacidade empreendedora, de fonte direta, para a Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte, em 1928. Na Capital ele iria desempenhar papel todo especial na atenção à criança mineira, sendo considerado o primeiro a exercer a pediatria exclusiva na cidade.
A S A Santa Casa vivia sob a égide do germanófilo Hugo Werneck, que não só a estruturou em moldes modernos, bastante diferentes das Santas Casas de tradição lusa, como trouxe, em 1909, irmãs-enfermeiras da Alemanha, da congregação Servas do Espírito Santo. Por outro lado, a acolhida a Navantino Alves estava facilitada por duas circunstâncias: o hospital vinha contando com o apoio filantrópico da família Veiga (a fazenda Taquaril dos Veiga descia a fralda da Serra do Curral e cobria parte do Bairro Santa Efigênia), enquanto o farmacêutico e médico Joaquim de Santa Cecília, outro integrante da família, havia cuidado de sua farmácia e depois criado seu Serviço de Olhos. Santa Cecília, também passara por Nepomuceno e ali se casara com Lazarina Veiga, tia de Elvira Veiga Sales Alves.
Navantino Alves, desde Juiz de Fora, entregou-se com o entusiasmo de um bandeirante, ao árduo trabalho de devassar os horizontes virgens da saúde infantil. Criou o Serviço de Crianças da Santa Casa de Belo Horizonte, depois o Hospital de Criança Elvira Gomes Nogueira (mais tarde o primeiro prédio da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais), o Instituto Mineiro de Combate à Desnutrição Materno-Infantil, a cadeira de Enfermagem Pediátrica da Escola de Enfermagem Hugo Werneck, a cátedra de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas e a desativada Fundação Navantino Alves (com seu Banco de Leite Humano), sendo também co-fundador do Hospital São José e da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais. Interessante lembrar que o Hospital de Crianças Elvira Gomes Nogueira, com três andares e 120 leitos de enfermaria, fechou um quarteirão de rua próxima à Santa Casa, foi o primeiro hospital pediátrico de Minas Gerais, construído com a doação de um tostão de cada entrada dos sete cinemas da empresa Agenor Gomes Nogueira, num total de 360 contos de reis e teve o nome da esposa de seu patrocinador.
Além do livro já referido, publicou Manual de Dietética na Patologia Infantil e Ligeira Visão da História da Pediatria. Venceu a livre-docência em pediatria na Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais, hoje Universidade Federal, com a tese Estudo Clínico da Pseudo-Paralisia sifilítica – Doença de Parrot, bem como exerceu importante liderança em entidades médicas, sempre ligadas à pediatria. Numa espécie de homenagem ao pai, além do periódico Escola Médica, manteve em Belo Horizonte por anos, a publicação trimestral Análise de Nutrição Materno-Infantil, onde resumia artigos de revistas nacionais e estrangeiras, sobre o assunto, por ele pesquisados e resumidos nos fins de semana na Biblioteca Baeta Vianna. Merece realce especial sua atuação diária e por maior tempo que qualquer outro líder da medicina mineira na formação de discípulos, inclusive de seus próprios filhos e neto, ilustres seguidores do pai e avô. Com ele se formaram Olavo Lustosa, Francisco Souza Lima, Abrahão Salomão, Maria Eulália Ramos, Clodoveu de Oliveira, José Maria Mares Guia, Antônio Malheiros Fiúza, José de Oliveira Lima, Berardo Nunan, Olavo de Resende Barros, Veiga Sales, Álvaro Guerra, entre outros. Em verdade, Navantino Alves, ao encerrar sua vida centenária, com 103 anos de lucidez invejável, mereceu ser proclamado de pai a tetravô da maioria dos membros da eminente comunidade pediátrica mineira.
Quando Edward Tonelli, cintilante estrela da infectologia pediátrica brasileira, defendeu sua tese de livre-docência, destacava-se na banca a figura provecta, mas ativa, de Navantino Alves. Estando eu entre os presentes, não pude evitar a emoção diante daquela cena: o examinando era um nepomucenense, orgulho de sua cidade natal, e o examinador era o nepomucenense adotivo de enorme projeção estadual e nacional – ambos a engrandecer aquela cidade acolhedora e generosa.
* Navantino Alves nasceu em Turvo, hoje Andrelândia, em 26 de abril de 1899 – e faleceu em Belo Horizonte em 16 de julho de 2002.